segunda-feira, fevereiro 01, 2010

Insónias

Na sequência de um desafio promovido pelo jornal "Comércio do Seixal e Sesimbra", onde deveremos escrever uma frase sobre insónias, para ganhar um livro, respondi ao desafio, mas fui mais longe.
Adaptei um texto (conto) que escrevi que agora vos apresento.

Não façam exercícios especulativos. É pura ficção.

Boa leitura e boa semana

CONTOS DE FIM-DE-SEMANA : Anatomia de um ”quase golpe” 



Eram cerca das 2 da manhã. O ambiente é o normal. Um porteiro pede € 5,00. Dá para duas cervejas ou uma bebida espirituosa. Provavelmente marada, digo eu, que sou o autor desta história.

O ambiente estava murcho. Faixa etária elevada para os padrões do nosso Anastácio. Comenta isso com o amigo. Este sossega-o. Ainda é cedo. “carne mais fresca” não tardará. Assegura.

Uma imperial. Acompanha-se a música. Estuda-se o ambiente. Alguns solteiros, almas solitárias, com olhar matador. Escolhem locais estratégicos, onde focar as suas presas.

O nosso Anastácio, está out de tudo isso. Pensa na sua vida. Curte a música. Dança compassada e lentamente pensando em tudo. Não está ali para caçar. Quer divertir-se. Cansa-o esse jogo do “gato e do rato”. Mas o jogo é mais forte do que ele. Ele é um sedutor. Tem de seduzir, mesmo quando não o quer fazer.

Com a abnegação própria de quem vai cumprir a sua obrigação, qual polícia que inicia o “giro”, Anastácio procura-a. Há-de encontrar. Não sabe o que quer. Quem quer, nem sequer para que quer, mas sabe que quer.

A pista vai enchendo. O seu amigo não falha. A “carne fresca” chega. Misturam-se odores. Hálito carregado a álcool, perfume intenso e sedutor. Tabaco, naquela tamanha mistura de fragâncias tão característica dos espaços de diversão.

De repente repara melhor. Há um casal jovem, que o observa desde que ele chegou. Ainda a pista estava vazia. De facto são os mais novos e mais bem parecidos. Talvez por serem um casal, Anastácio nem havia fixado bem. Um olhar furtivo. Outro olhar. Observador. De facto ela tem sex-appeal. Calças de ganga. Camisa branca. Dança com uma cerveja na mão. Olhar correspondido. Coincidência pensou. A distância entre eles era considerável. O fumo e os corpos das outras pessoas, quais figurantes, obrigam-nos a um zigzaguear constante na procurava desse olhar. Já não furtivo..

Anastácio comentou com o amigo sobre a presença do casal e, sobre o facto de estranhamente lhe ter escapado aquela “miragem”. O amigo referiu que estava a observá-los e não lhe parecia que fossem namorados. Talvez irmãos. Estava lançado o desafio.

Anastácio decide certificar-se se ela o observava a ele, ou era apenas coincidência de ambos estarem virados um para o outro embora em lados opostos da pista. Um olhar “preso” um no outro. Um sorriso. O parceiro dela a observar. Atrapalhação total. Há que evitar problemas, mas a dúvida instala-se. Novo olhar de relance, quase simultâneo com o dela. Ligeiro sorriso.

Ela dá um forte indicador, mexe nos cabelos, alisa-os. Olham-se. Observam-se. Será? E ele? Namorado? Comentam algo um para o outro. Riem-se os dois. Estarão a gozar com ele?

O acompanhante vai buscar mais duas cervejas. Cruza-se com o Anastácio, que comprometido desvia o olhar. Ele sorri. Está “por cima”. O que se está a passar?

As trocas de olhar entre a jovem e Anastácio intensificam-se. A atracção é mútua. Já nada se interpõe entre os seus olhos. Nada não é bem assim, uma rapaiga lembra-se de dançar quase em cima do Anastácio. É engraçada, porém Anastácio nem repara. Ela dança com um gordo que tenta desesperadamente chamar-lhe a atenção. Ela cola o seu corpo a Anastácio. Meneia o cabelo e as ancas. Ele cheira-lhe o champô e até o perfume, tal a proximidade quando ela se deixa descair. Anastácio, não é que não esteja a gostar, mas naquele momento as suas prioridades são outras. Afasta-a. Afasta-se dela. Ela em cima dele, mais o raio do gordo tapam-lhe a visão. Escolhe outro angulo. Tenta escapar ao ângulo de observação do acompanhante. Não consegue. O acompanhante faz questão de continuar a observá-los. Estranho. Ela, porém, continua a olhá-lo. Agora dança com um sorriso aberto que permite ver à distância uns lindos e brancos dentes.

Anastácio decide afastar-se. Procura outro lado da pista. Não quer confusões e há um acompanhante pelo meio. Muda de local e dança de costas. Tenta esquecer a sua imagem. Fica assim um pouco. Bebe também ele outra cerveja. Geladinha. Para arrefecer os ânimos. Tenta concentrar-se na música. Recordar-se de outras situações.

De repente, tem-na à frente. Foi ele que a procurou? Foi ela? Foi o destino? O que importa isso agora? Eis que ela está sozinha. Anastácio não avança. Falta saber do acompanhante. Dançam assim, um para o outro. Tudo o resto deixa de existir. Olhos nos olhos, á distância de um click. Conseguem cheirar o odor um do outro. Os corpos tocam-se, primeiro ao de leve, depois despudoradamente. Ele não a beija. Não a quer beijar. O beijo é apenas um beijo. Assim a magia dura a noite toda. O acompanhante reaparece, quando Anastácio está quase a entregar os pontos. O desejo estava ao rubro. Anastácio afasta-se. O acompanhante imbuído por um novo alento começa a tentar algo. Percebe-se que não namoram. Ela, com o acompanhante no meio dos dois, desafia a gravidade e mantém os olhos fixos em Anastácio. Como um íman. Riem-se um para o outro. Anastácio desfruta do momento. Sem uma palavra, sem um beijo, ele consumiu-a. Consumiu a sua alma.

De repente a música pára. Hora de encerrar. Cada um para o seu lado. Dever cumprido. Uma dúvida persiste na cabeça Anastácio : Que raio era o acompanhante: Amigo (pretendente), namorado ou irmão?
O que perdura na mente de Anastácio? A garantia de uma insónia...

11 comentários:

Clara disse...

Paulo,

A tua capacidade de escrever é de facto extraordinária. É nesessária uma grande capacidade para conseguir passar para o papel emoções, sensações, até aromas, de forma a colocar o escritor no local da narrativa.

Anónimo disse...

Clara...já a sua é lastimável: "NESESSÁRIA"!?!?!?

Espero que esta Clara não seja a Clara Carneiro, caso contrário ia rir-me bastante.

Sofia disse...

Os eventos nascem por acaso, mas podem ter um valor importante. Cada encontro pode ser uma solução definitiva para alguns dos nosos receios, medos e inseguranças. Principalmente se encontramos alguém com uma imagem que habita em nós, como um sonho ou um mito que se materializa.
O encontro é uma materialização de uma ideia e quando acontece, por si só, tem um grande valor.
Diante do encontro precisamos viver a magia do momento, observar o "milagre" que acontece e que nós mesmos, talvez, involuntariamente determinamos.
Após um encontro significativo poderá surgir nova criatividade, novos amores, novos interesses.
Como diz J.L.Moreno – “Um Encontro de dois: olhos nos olhos, face a face.
E quando estiveres perto, arrancar-te-ei os olhos e colocá-los-ei no lugar dos meus;
E arrancarei meus olhos para colocá-los no lugar dos teus;
Então ver-te-ei com os teus olhos e tu ver-me-ás com os meus."

Um olhar poderá mesmo valer por mil palavras...

Anónimo disse...

"Insónias"

1 da manhã
Deito-me, viro-me
Reviro-me, tapo-me
Descubro, penso
Repenso, tenso

Na madrugada fria em insónia profunda

Preciso dormir, pois amanhã é 2ª
Procuro, sem exito, abster-me do mundo

O pensamento parece cada vez mais profundo

2 da manhã
fumo um cigarro, observo
enervo-me, idealizo
Realizo, discordo
Recordo, acordo

Não há momento melhor do que a noite para analisar a vida, um turbilhão de ideias perpetua-se

Já cansada, a cabeça sem descanso

Resolvo levantar-me, pegar num lápis e numa borracha

3 da manhã
Desenho, escrevo
Descrevo, rabisco
Risco, misturo
Procuro, escuro

Não aguento, paro
Reparo, deito-me
Sem jeito, tapo-me
Viro-me

Reviro-me, aqueço-me
Tento, não desisto
Insisto, respiro
Expiro, trago

E por fim apago

Magda disse...

Paulinho tu és demais. Por acaso não seria melhor encerrar esta xafarica?
Tu já tens o tacho, o que queres mais?

Francisco disse...

qual sua posição, na intenção do PSD em destabilizar o país com a aprovação da lei das finanças regionais?

Paulo Edson Cunha disse...

Magda, sabe porque não encerro esta "xafarica"(como lhe chama)?
porque escrevo para mim, para os meus amigos e para quem quer ler. Já lhe passou pela cabeça não visitar esta "xafarica"?
Passar, passou, mas não era a mesma coisa.
Olhe, como sei que não resiste, vá voltando ( e sem a consciência pesada)...

Francisco, se perguntasse de uma forma mais séria, até lhe responderia que não estou 100% de acordo com a posição do PSD, mas como apenas veio provocar, fique com o meu silêncio sobre essa questão (assim até posso ter um "tacho" no governo...lol)...

Anónimo disse...

SÁBADO, DIA 06 DE FEVEREIRO PELAS 14H

ASSEMBLEIA ASSOCIAÇÃO AMIGOS PINHAL GENERAL

www.viverpinhaldogeneral.blogspot.com

Magda disse...

Paulinho respondestes e muito bem á questão da xafarica. Eu respeito a tua decisão, embora não concorde com a mesma.
Ficou por esclarecer a questão da panela, desculpa, do tacho.
Qual é a tua opinião?

Paulo Edson Cunha disse...

Magdazinha,

A sua definição de democracia está um pouco distorcida, sabia?

Então a menina não sabe que fui eleito democraticamente pela população do Seixal e que o pelouro foi aceite após convite do Sr. Presidente da Câmara (conforme determina a lei) e com a concordância do meu partido, quer da comissão política, quer em sede de Assembleia de Secção (que nem era obrigatória, mas que fiz questão de assegurar)?

Por haver pessoas como a menina é que o nosso País não vai para a frente. Enfim...

Olhe, um excelente fim-de-semana e, tente descontrair (faz bem à azia).

Permita-me a liberdade de lhe endereçar um bjinho por cumprimento

Anónimo disse...

Seguramente namorado... :)